Com R$ 4 bilhões já sonegados em pagamentos de Cfem, TCU cobra ANM para que evite calotes de mineradoras

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O Tribunal de Contas da União (TCU) cobrou, por meio de determinações expedidas pelos ministros da Corte nesta quarta-feira (9), que a Agência Nacional de Mineração (ANM) tome medidas para aprimorar o combate à sonegação de Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem) por parte das mineradoras. A determinação tem, como base uma auditoria realizada pelo TCU que identificou perdas de R$ 4 bilhões com o não pagamentos da Cfem, indicando que a atuação da agência para fiscalizar o pagamento tem sido insuficiente.

Entre as determinações do TCU estão aprimorar o monitoramento da arrecadação e apresentar ao Tribunal um plano de ação para desenvolver o Sistema Nacional de Arrecadação, Receita e Cobrança, colocando-o em funcionamento no menor prazo possível.

O TCU ainda recomenda que a agência avalie a possibilidade de firmar convênios com secretarias de fazendas estaduais para obter acesso a notas fiscais eletrônicas e atuar junto à Secretaria de Governo Digital para promover a integração de informações.

Ainda segundo a auditoria do TCU, por falta de sistemas eficientes de controle da ANM, a perda com a sonegação da Cfem em potencial tende a atingir R$ 20 bilhões, em créditos já lançados referentes aos royalties da mineração, mas que ainda não foram constituídos.

Alerta

A Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (Amig) vem chamando a atenção para a postura negligente do Governo Federal em relação à cultura da sonegação que permeia a atividade mineral no Brasil.

A Amig destaca que os números assustadores reforçam os pleitos que, há décadas, a entidade defende para acabar com a prática da autofiscalização e da autorregulamentação adotadas pelas empresas mineradoras. A associação já se posicionou dezenas de vezes cobrando uma atuação mais firme no Congresso Nacional, no Governo Federal e na própria ANM.

“A AMIG completou, neste ano, 35 anos de fundação e o que temos visto é que o Brasil, nas últimas décadas, relegou a atividade de mineração a segundo plano. Temos uma agência mineradora sem estrutura e sem pessoal para executar seu papel fiscalizador e regulador, o que propicia o crescimento de escândalos e catástrofes no setor”, diz o presidente da Amig, José Fernando Aparecido de Oliveira.

Fiscalização deficitária

Conforme o levantamento divulgado pela Amig, em 2022, a ANM fiscalizou apenas 17 empresas de mineração em um universo de 39.024 processos ativos na fase de lavra. No período de 2017 a 2021, foram fiscalizados apenas 1,1% de 6.154 processos ativos na fase de concessão de lavra sem pagamentos da Cfem associados a eles e somente dois dos 1.163 processos ativos de autorização de pesquisa com guia de utilização emitida.

A associação tem questionado o fato de os sistemas atuais da ANM não permitirem o acompanhamento da real produção mineral fiscalmente escriturada, não sendo possível ter conhecimento do quanto se deixa de arrecadar e do valor monetário submetido ao risco de decadência.

Na auditoria realizada pelo TCU estimou-se que, no período de 2014 a 2021, a arrecadação poderia ter sido entre 30,5% e 40,2% superior, o que representa uma receita potencial da CFEM não arrecadada na faixa entre R$ 9,38 bilhões e R$ 12,35 bilhões, no mesmo período, enquanto a arrecadação dos royalties, em 2021, foi de R$ 10,3 bilhões.

A entidade lembra que o setor mineral lida com grandes margens de lucro, o que pode criar pressão intensa para maximizar os ganhos. Segundo a Amig, isso pode levar algumas empresas a buscar formas de reduzir custos de maneira antiética, incluindo a sonegação fiscal e a evasão de regulamentações.

A associação destaca, ainda, que a mineração é um setor com operações complexas e frequentemente em regiões remotas. A falta de transparência nas operações e nas transações financeiras facilita as práticas de sonegação e evasão fiscal. “Sistemas de tecnologia da informação obsoletos e limitados, quadro de pessoal reduzido e insuficiência de acordos de cooperação com a Secretaria da Receita Federal e secretarias de fazenda estaduais são as principais causas que levam à subarrecadação de receitas minerárias e à decadência e prescrição dos respectivos créditos”, aponta a Amig.

A associação alerta que a sonegação da Cfem e a decadência e prescrição de créditos dela decorrentes prejudicam a União, os estados/Distrito Federal e municípios produtores e afetados. Além disso, a própria ANM poderia se beneficiar de bilhões de reais a mais por ano em arrecadação.

Calote da Vale

Desde agosto de 2022, a associação tem realizado uma campanha nacional cobrando uma dívida bilionária da Vale S/A com 28 cidades brasileiras, que ultrapassa R$ 2,4 bilhões, referente ao não pagamento dos royalties de mineração por parte da mineradora. A dívida se refere a um período de quase 20 anos de exploração.

A dívida foi auditada pela ANM, na época representada pelo extinto Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). “É um montante que foi apurado de 1996 a 2005; ou seja, daqui a dois anos, a dívida vai completar 30 anos”, esclarece o consultor de Relações Institucionais e Econômicas da Amig, Waldir Salvador.

“Fomos à Vale inúmeras vezes para dialogar. A justiça derrotou, por 13 vezes em primeira instância e uma vez em segunda instância, a tese que a Vale defende para não pagar o royalty da mineração. E já perdeu todas as vezes, administrativamente. Inclusive, a dívida foi ratificada em um grupo de trabalho em 2018, formado pelas prefeituras e pela ANM, a pedido da própria Vale”, enfatiza o consultor.

A Vale, por sua vez, diz ter repassado cerca de R$ 24 bilhões em Cfem nos últimos anos. A mineradora ainda afirma que várias ações sobre o tema tramitam na justiça sem julgamento final do mérito e que divulga os dados sobre pagamento de Cfem em seu Relatório de Transparência Fiscal.

Alinhamento

Técnicos da Amig e da Superintendência de Arrecadação da ANM se reuniram, no último dia 26 de agosto, para apresentadas avaliar sugestões para trabalho em conjunto em pleitos que visam garantir uma atividade mineral segura e justa para o lado público e privado da mineração. De acordo com a Amig, a agência mostrou estar em processo de reestruturação e que novas resoluções serão publicadas a partir de outubro deste ano, com o objetivo de melhorar a eficácia da fiscalização e o aperfeiçoamento dos sistemas.

Além disso, foi informado que, até dezembro desse ano, será publicado o edital do concurso e a nomeação dos novos servidores deverá ocorrer em outubro de 2025, com a ANM ganhando reforço no quadro de funcionários para atuar na fiscalização. Atualmente, há apenas três fiscais responsáveis pela fiscalização do pagamento da Cfem em todo o Brasil.

“Essa situação é insustentável e, se persistir, vai destruir a atividade mineral. A ANM precisa estar no patamar das demais agências reguladoras federais. Afinal, a mineração representa 4% do PIB do Brasil. Dessa forma, o país permitirá que ela se estruture, modernize, execute seu planejamento estratégico e, como consequência, teremos o crescimento da arrecadação, a diminuição ou quem sabe até a erradicação da cultura permanente de sonegação, da falta de transparência, da evasão fiscal, da corrupção e do desrespeito às normas ambientais predominantes na atividade de mineração”, alerta Waldir Salvador.

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