A Riqueza Descartada – Mineração Urbana: O lixo é um problema mundial. A destinação dos resíduos produzidos pelas indústrias, pela construção civil, pelos diversos empreendimentos e pelas pessoas, em geral, é uma questão que deve ocupar a mente de toda a humanidade.
A mineração urbana, na esteira do conceito da atividade da mineração tradicional (que extrai os recursos minerais, a partir da lavra de uma jazida, com o seu consequente processamento), pretende implementar a prática de aproveitamento econômico dos recursos resultantes dos resíduos pós-consumo.
A mineração urbana é, então, uma prática que envolve a recuperação de recursos valiosos de resíduos pós-consumo e rejeitos, especialmente de produtos eletrônicos descartados, lixos industriais e descartes de construção civil, em áreas urbanas. Essa abordagem visa aproveitar materiais preciosos contidos em produtos descartados, reduzir a necessidade de extração de recursos naturais e minimizar a deposição de resíduos em aterros sanitários.
O termo surgiu, em 2012, na Revista Forbes, para evidenciar os benefícios da gestão dos resíduos eletrônicos e desenvolveu-se como uma estratégia interessante para a composição dos conceitos que envolvem a sustentabilidade.
Com a mineração urbana, poderão ser recuperados materiais metálicos raros ou comuns, materiais não metálicos, estratégicos ou essenciais, resíduos de eletrônicos ou de construção civil, promovendo a recirculação das riquezas, reciclagem de produtos e materiais pós-consumo e a consequente redução dos impactos ambientais e sociais, valorização dos resíduos e otimização dos processos e benefícios econômicos: ou seja, uma prática sustentável.
A prática da mineração urbana promete ser um ótimo instrumento para a geração de uma economia circular, uma forma eficiente e lucrativa de exploração dos resíduos descartados, ricos em seus materiais agregados, numa gestão de ciclos produtivos que permitirá a redução de importantes impactos socioambientais, além de se configurar em novas oportunidades de mercado.
Os materiais que se acumulam nos produtos prontos e acabados são diversos e, com o fim da vida útil desses produtos, tornam-se lixo, numa concepção mais rasa da análise.
Sem dúvidas, o lixo eletrônico (e-waste) é um dos resíduos sólidos que mais cresce no país e sua decomposição demanda longuíssimo tempo na natureza. Um fator de crescimento desse descarte eletrônico é a rápida evolução tecnológica que vivencia a humanidade, com o consequente e altíssimo consumo no mercado atual.
Recirculação gera riqueza
Se, de um lado, esse lixo eletrônico contém grande quantidade de substâncias tóxicas à saúde do homem e do ambiente, por outro lado, tem, em si, agregados inúmeros componentes que podem ser reaproveitados, reciclados, renovados, reparados, restaurados…. todo esse conjunto de R’s se configura em ótima estratégia de sustentabilidade, com a recirculação da economia, evitando-se maiores custos industriais, exploração de recursos naturais, emissão de gases de efeito estufa, poluição da água, do solo e do ar, minimização de geração de resíduos, além da contribuição para a melhoria das condições climáticas em todo o planeta.
O crescimento do e-waste tem impactos ambientais e econômicos mundialmente significativos: 5% de todo o resíduo gerado no mundo é sucata eletrônica. O Brasil gerou cerca de 98 mil toneladas de e-waste, em 2012, somente perdendo para a China. A reciclagem de todo e-waste renderia cerca de 1 bilhão de reais por ano para o Brasil. Mas apenas 15% dos computadores são reciclados. Somente o Estado de Minas Gerais gerou em torno de 60.000 toneladas, no ano de 2009, com base nos dados do IBGE, em uma estimativa subestimada, desde que se contou 1 computador por residência.
De acordo com a Microsoft, hoje há mais de 40 milhões de computadores instalados no Brasil e a cada ano chegam mais 10 milhões, sendo 2 milhões descartados anualmente. De acordo com dados da ONU, em 2012, 320 toneladas de ouro foram empregadas por ano na produção de celulares e equipamentos de informática no mundo (FEAM, CMRR, SERVAS e Microsoft Brasil, convidado: Instituto de Tecnologia Suíço – EMPA, 2009). (Xavier, Lucia H – Mineração Urbana de Resíduos Eletroeletrônicos – Brasil Mineral n.379).
Em mais de dez anos, o crescimento desses descartados demanda atenção especial.
Evidentemente, as decisões provenientes das políticas públicas e a consequente legislação poderão – e deverão – planejar essa mina urbana, disciplinando o melhor destino dos produtos descartados.
Os resultados dos impactos socioambientais e comerciais associados a esses altos níveis de descartes têm sido avaliados pelos diversos países, em todo o mundo, como oportunidades, não só como descontaminação do ambiente, mas como alternativas de incentivos econômicos: o foco se volta para um conceito de ecoeficiência, inclusão social, crescimento de mercado, maior produção e menor consumo de energia, menor desgaste ambiental, maior proteção dos cursos dágua, superficiais e subterrâneos, geração de melhores condições climáticas, diante da evidente e grave crise enfrentada atualmente.
Em particular, a mineração urbana está alinhada com o ODS 12 (Consumo e Produção Responsáveis) e o ODS 13 (Ação Climática), entre outros, promovendo práticas sustentáveis de consumo e produção e reduzindo a emissão de carbono. Ou seja, é a demonstração de prática perfeitamente alinhada com a Agenda de Sustentabilidade, Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e ESG (Environment/ambiente, Social e Governança).
O tema deste novo conceito de mineração urbana, no Brasil, requer muita atenção da sociedade, diante do importante potencial para a recuperação de materiais agregados ao descarte no país. O conhecimento da situação pelo povo brasileiro deve ser incentivado, levado a público, por todos os meios, educacionais e científicos, de publicidade e de economia, tendo por diretriz a sustentabilidade e a competitividade do mercado: a riqueza está descartada e precisa ser resgatada.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) envolve os três níveis dos entes federados e integra a Política Nacional de Meio Ambiente, a Política Nacional de Educação Ambiental, Política Nacional de Recursos Hídricos, Saneamento Básico, Gestão Urbana, Tecnologia e Comércio.
É preciso, afinal, estarmos atentos a esse novo e promissor panorama: a mineração urbana é uma prática socioambientalmente desejável e apresenta benefícios substanciais, sob os princípios da sustentabilidade, dos critérios ESG e da Agenda 2030.
As empresas que a adotam poderão, não apenas contribuir para a proteção do meio ambiente, mas também fortalecer sua posição no mercado, promover a economia circular e avançar em direção a um futuro mais sustentável.
Márcia Itaborahy e Mariana Santos