Os minerais críticos e estratégicos estão cada vez mais no centro das discussões globais sobre transição energética, desenvolvimento industrial e segurança econômica. O Brasil, por sua riqueza geológica, está no foco dessa disputa e enfrenta o desafio de transformar seu potencial mineral em soberania econômica e protagonismo internacional.
Participar do Seminário Internacional de Minerais Críticos e Estratégicos 2025, em Brasília, foi decisivo para percebermos o quanto o Brasil ainda precisa amadurecer suas políticas e consolidar seu papel como protagonista na geopolítica dos minerais. Foi um evento intenso, reunindo representantes de governos, empresas, academia, sociedade civil e especialistas internacionais para discutir desafios e oportunidades dessa pauta estratégica.
Antes de avançar, é importante definir com clareza os conceitos de minerais críticos e estratégicos. Minerais críticos são aqueles cuja cadeia de suprimento apresenta alto risco de interrupção, seja por concentração geográfica da produção, instabilidade política, barreiras logísticas ou volatilidade econômica. Eles são essenciais para setores como energia renovável, mobilidade elétrica, tecnologia digital, defesa e fertilizantes. Entre os mais citados estão lítio, cobalto, grafita, níquel, terras raras e cobre — insumos vitais para baterias, painéis solares, turbinas eólicas, veículos elétricos e outras tecnologias de baixo carbono (Seguradora UFMG, 2024).
Já os minerais estratégicos podem ou não coincidir com os minerais críticos, mas são definidos por sua importância para a segurança nacional, a defesa e cadeias produtivas consideradas essenciais. No Brasil, a Resolução nº 2/2021 do Ministério de Minas e Energia classifica como estratégicos minerais como nióbio, lítio, grafita, terras raras, manganês, cobre, alumínio, ferro e urânio, entre outros.
A geopolítica internacional desses minerais é marcada por uma disputa crescente entre grandes potências. A China, por exemplo, domina o refino de cinco dos seis principais minerais críticos (lítio, cobalto, grafita, terras raras e níquel), criando dependência global que afeta diretamente as cadeias produtivas de energias renováveis e tecnologias avançadas (IEA, 2024). Nos Estados Unidos, mais de 70% de alguns minerais estratégicos vêm da China, gerando vulnerabilidades que motivaram medidas de incentivo à produção nacional e acordos de cooperação internacional (Euronews, 2025).
Além de Estados Unidos, Canadá, Austrália e União Europeia, outros países também lançaram estratégias nacionais para garantir o abastecimento seguro desses minerais e reduzir a dependência de fornecedores instáveis. O artigo publicado pela In the Mine (2025) destaca que o Brasil, apesar de seu potencial mineral, precisa definir com urgência sua posição estratégica: se será apenas exportador de matéria-prima ou se investirá em tecnologia, agregação de valor, proteção ambiental e respeito aos direitos das comunidades afetadas.
Essa urgência ficou evidente no Seminário em Brasília, que apontou a necessidade de uma governança pública que integre responsabilidade empresarial e compromisso social. A infraestrutura logística precária, sobretudo em regiões mineradoras, é outro obstáculo que impede o Brasil de transformar seus recursos naturais em desenvolvimento de longo prazo. Sem rodovias, ferrovias, portos e conectividade digital de qualidade, os minerais críticos e estratégicos correm o risco de seguir o caminho histórico da exportação bruta, sem gerar emprego e tecnologia para o país.
No aspecto jurídico, o Brasil precisa modernizar seu Código de Mineração para incluir instrumentos de política industrial, sustentabilidade ambiental e inovação tecnológica. Além disso, merece destaque a recente aprovação pelo Senado do Projeto de Lei nº 2.159/2021, que institui a Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA). O projeto visa uniformizar e simplificar os procedimentos de licenciamento ambiental no país, incluindo dispositivos como a Licença Ambiental Especial (LAE) e a Licença por Adesão e Compromisso (LAC). Também passa a incluir a mineração de grande porte ou alto risco na cobertura da nova legislação — corrigindo a exclusão que existia na versão anterior (Senado Federal, 2025).
Apesar das intenções de desburocratizar o processo, a proposta da LGLA precisa ser analisada com muito critério. Ambientalistas, especialistas e o Ministério do Meio Ambiente alertam para riscos de retrocessos na proteção ambiental e potenciais conflitos com a Constituição Federal (UOL, 2025). É essencial que o país encontre o equilíbrio necessário entre desenvolvimento econômico e proteção socioambiental, garantindo que o licenciamento ambiental continue sendo uma ferramenta eficaz para resguardar os direitos das comunidades afetadas.
A governança mineral não pode se desconectar dessas questões. As comunidades locais devem ser ouvidas desde o planejamento até a execução das atividades minerárias. Processos de licenciamento ambiental devem ser robustos e céleres, evitando burocracias desnecessárias, mas também impedindo flexibilizações que fragilizem direitos fundamentais. A compensação socioambiental precisa ser real, com fiscalização efetiva e participação da sociedade civil.
É inadmissível que, em pleno século XXI, as regiões mineradoras do Brasil convivam com desigualdade, falta de serviços básicos e baixa qualidade de vida, enquanto bilhões de reais em royalties e impostos alimentam cofres públicos sem retorno adequado para os territórios. A mineração precisa devolver ao território o que dele retira.
A geopolítica dos minerais críticos não é apenas uma questão de diplomacia mineral, mas também de disputa por tecnologia, agregação de valor e respeito às pessoas. Se o Brasil continuar exportando matéria-prima bruta, outros países transformarão esses recursos em empregos qualificados, inovação e poder econômico. Precisamos de políticas que permitam ao país ocupar uma posição estratégica nas cadeias globais de valor.
As empresas que atuam na mineração de minerais críticos e estratégicos têm responsabilidades inegociáveis. Minerar em território brasileiro deve estar alinhado com a Constituição, com os direitos humanos e com as melhores práticas ambientais. Empresas que não respeitam esses princípios devem ser responsabilizadas de forma exemplar.
Reiteramos: o desenvolvimento econômico não pode se sobrepor aos direitos constitucionais das comunidades, ao meio ambiente e à segurança jurídica. O Brasil precisa demonstrar maturidade institucional para transformar seus minerais críticos e estratégicos em instrumentos de justiça social e desenvolvimento sustentável.
Não basta ter riquezas minerais; é preciso demonstrar compromisso com o país. E isso só se faz com responsabilidade, ética, transparência e respeito pelas pessoas e pelo meio ambiente.
Referências:
Euronews (2025). EUA buscam reduzir dependência da China em minerais críticos. Disponível em: https://pt.euronews.com/business/2025/04/16/trump-lanca-investigacao-sobre-minerais-criticos
IEA (2024). Critical Minerals Market Review. Disponível em: https://www.iea.org/reports/critical-minerals-market-review-2024
In the Mine (2025). Geopolítica dos Minerais Críticos – Parte 01. Disponível em: https://www.inthemine.com.br/site/geopolitica-dos-minerais-criticos-parte-01
Senado Federal (2025). Senado aprova Projeto da Lei do Licenciamento Ambiental. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2025/05/21/senado-aprova-projeto-da-lei-do-licenciamento-ambiental
Seguradora UFMG (2024). Minerais Críticos: o que são e exemplos mais comuns. Disponível em: https://www.segufmg.com/post/minerais-cr%C3%ADticos-o-que-s%C3%A3o-e-exemplos-mais-comuns
UOL Notícias (2025). Marina Silva alerta para riscos do Projeto da Lei do Licenciamento Ambiental. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2025/06/02/marina-quer-reduzir-danos-do-pl-do-licenciamento-ambiental-veja-o-que-muda.htm
