A sustentabilidade hídrica na mineração

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A atividade minerária, essencial para o desenvolvimento econômico global, resulta em impactos profundos e complexos sobre a qualidade das águas superficiais e subterrâneas. Circunstância de ciência geral, já temos abordado variados temas sob este enfoque, por diversas vezes.

À medida que a mineração se expande, as mineradoras assumem uma responsabilidade cada vez mais qualificada em relação à preservação e gestão dos recursos hídricos. A gestão da água, elemento indispensável à vida e a sustentabilidade das comunidades – de toda a humanidade, de fato – faz-se essencial em regiões de intensa atividade mineradora, onde a contaminação e a degradação dos corpos hídricos se tornam preocupações centrais.

A mineração demanda volumes expressivos de água para diversos processos, como a perfuração, a fragmentação de rochas, a separação mineral, o transporte de minérios e rejeitos, e o resfriamento de equipamentos. Este consumo elevado impõe uma pressão substancial sobre os recursos hídricos locais, afetando tanto a quantidade quanto a qualidade das águas disponíveis. Em muitos casos, as práticas minerárias resultam na poluição das águas, seja por meio de efluentes não tratados ou pelo escoamento de materiais tóxicos, como metais pesados e resíduos químicos, que acabam contaminando rios, lagos e aquíferos.

O impacto da degradação das águas sobre a sociedade é profundo e duradouro. A contaminação de aquíferos e rios pode levar à escassez de água potável, prejudicar a biodiversidade aquática e comprometer a segurança alimentar das comunidades que dependem da pesca e da agricultura. Além disso, a poluição das águas pode resultar em custos elevados para a saúde pública, devido ao aumento de doenças relacionadas à água contaminada, como doenças gastrointestinais, dermatológicas e outras tantas.

Um dos impactos mais críticos sobre as águas é a drenagem ácida de mina (DAM), fenômeno que ocorre quando minerais sulfetados expostos à água e ao oxigênio formam ácido sulfúrico, que, por sua vez, dissolve metais tóxicos presentes nos resíduos de mineração. Esse processo resulta em uma mistura altamente ácida e contaminada que pode se infiltrar no solo, atingindo os lençóis freáticos e corpos d’água superficiais, causando danos ambientais de longa duração e, em muitos casos, irreversíveis. As áreas afetadas por DAMs enfrentam problemas gravíssimos, incluindo a morte de organismos aquáticos, a perda de biodiversidade e a inviabilidade do uso da água para consumo humano e irrigação.

Os estudos de impacto ambiental (EIA) e social (EIS) são ferramentas indispensáveis para mitigar esses riscos. Antes do início das operações, é essencial que as mineradoras conduzam avaliações detalhadas que incluam análises físico-químicas dos corpos hídricos, identificação dos usuários de água na área impactada, e testes específicos para prever os potenciais efeitos da mineração sobre as águas. Essas avaliações devem ser acompanhadas por um monitoramento contínuo, que permita a detecção precoce de qualquer alteração na qualidade da água e a implementação imediata de medidas corretivas.

Além disso, o conceito de gestão integrada dos recursos hídricos deve ser central nas operações minerárias. Este conceito envolve a otimização do uso da água, a reutilização e reciclagem de efluentes, e a disposição final dos resíduos de forma que minimizem os riscos de contaminação.

Está-se diante da necessária aplicação da prevenção, da precaução e da prática inarredável dos instrumentos dessa gestão integrada que levem à sustentabilidade.

A água é um recurso vital, já sabemos, e sua degradação afeta de maneira profunda a sociedade em geral e, de forma mais intensa, as comunidades que vivem no entorno dos empreendimentos minerários. Evidentemente, nas áreas próximas às minas, os impactos são ainda mais severos, pois a população local depende diretamente dos recursos hídricos para suas necessidades básicas e para o sustento de suas atividades econômicas.

Para prevenir esses impactos, o monitoramento contínuo da qualidade da água é uma responsabilidade inalienável das mineradoras: pode garantir a sustentabilidade das atividades minerárias e a proteção dos recursos hídricos das comunidades afetadas.

À medida que a mineração avança tecnologicamente, o emprego de ferramentas modernas para o acompanhamento e controle da qualidade das águas torna-se uma prática indispensável, não apenas para evitar a degradação dos corpos hídricos, mas também para assegurar o cumprimento das responsabilidades socioambientais das mineradoras. O uso de tecnologias avançadas, como sensores em tempo real, drones e sistemas de informação geográfica (SIG), permite um acompanhamento preciso das condições dos corpos d’água. Esses dispositivos podem detectar mudanças na composição química da água, como o aumento da acidez ou a presença de contaminantes, possibilitando uma resposta rápida e eficaz para mitigar possíveis danos.

Além disso, a inteligência artificial (IA) tem se mostrado uma ferramenta poderosa no monitoramento da qualidade da água. Algoritmos de IA podem analisar grandes volumes de dados em tempo real, identificando padrões que indicam a deterioração da qualidade da água antes que os danos se tornem irreversíveis. A automação, aliada à IA, facilita a tomada de decisões, permitindo que as mineradoras implementem medidas preventivas e corretivas de forma mais ágil e eficiente.

As mineradoras também têm à disposição métodos já estabelecidos para a recuperação de águas degradadas. A biorremediação, por exemplo, utiliza microrganismos para degradar ou neutralizar poluentes na água, restaurando sua qualidade. Outro método, a fitorremediação, emprega plantas para absorver, degradar ou estabilizar contaminantes presentes na água e no solo, ajudando na recuperação de áreas impactadas pela mineração.

A reciclagem dos recursos hídricos na mineração tem sido uma aposta efetiva para os empreendimentos: trata-se de um processo de reutilização da água utilizada nas diversas etapas das operações minerárias. Em vez de descartar a água após seu uso inicial, as mineradoras implementam sistemas que permitem a captura, o tratamento e a reintegração dessa água no ciclo produtivo. Esse processo não só reduz a demanda por novas fontes de água, conservando os recursos hídricos naturais, mas também minimiza o impacto ambiental ao diminuir a quantidade de efluentes descartados no meio ambiente. A reciclagem da água, como um dos instrumentos disponíveis, resulta em uma operação mais sustentável, promovendo a eficiência no uso dos recursos e contribuindo para a preservação dos ecossistemas aquáticos nas áreas de influência das atividades minerárias.

A aplicação dessas técnicas, porém, requer um compromisso contínuo e uma abordagem integrada. Não basta realizar o monitoramento e a recuperação de forma pontual; é necessário que esses processos estejam inseridos em uma estratégia de longo prazo que priorize a sustentabilidade e o respeito às comunidades locais e à sociedade como um todo. A gestão responsável dos recursos hídricos deve ser vista como uma parte essencial da operação minerária, refletindo uma postura proativa das empresas em relação à proteção ambiental e ao desenvolvimento social.

No cenário internacional, países como Canadá e Austrália têm adotado políticas rigorosas de proteção ambiental e gestão hídrica em suas operações minerárias, servindo como exemplo de boas práticas que podem ser adaptadas ao contexto brasileiro. A responsabilidade das mineradoras em relação à água não se limita apenas ao cumprimento das normas ambientais; é um compromisso ético e social com as comunidades e com o futuro sustentável. A água, sendo um recurso essencial e finito, exige uma gestão cuidadosa que garanta sua disponibilidade e qualidade para as gerações futuras.

As mineradoras têm a oportunidade de liderar essa transformação ao incorporar práticas que respeitem o meio ambiente e promovam o bem-estar coletivo. A gestão eficaz dos recursos hídricos deve ser vista como um componente essencial da licença social para operar, garantindo que a mineração, uma atividade intrinsecamente impactante, seja conduzida de maneira responsável e sustentável. Essa abordagem não só protege o meio ambiente, mas também assegura a continuidade das operações minerárias e fortalece a confiança da sociedade na capacidade das empresas de equilibrar desenvolvimento econômico com preservação ambiental.

Diante desse cenário, a responsabilidade das mineradoras não se restringe apenas ao monitoramento das águas, mas também à implementação de ações efetivas de recuperação e proteção dos recursos hídricos. As empresas devem adotar práticas que vão além do cumprimento das exigências legais, integrando os critérios de ESG (Environmental, Social, and Governance) e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em suas operações. Isso inclui o engajamento com as comunidades do entorno, garantindo que suas vozes sejam ouvidas e que suas necessidades sejam atendidas de forma justa e equitativa.

A sustentabilidade e a responsabilidade socioambiental são pilares que devem nortear todas as atividades minerárias. Ao adotar uma abordagem responsável e proativa, as mineradoras podem não apenas minimizar os impactos negativos de suas operações, mas também contribuir para a recuperação e proteção dos recursos hídricos. Essa postura fortalece a confiança da sociedade nas empresas e assegura que o desenvolvimento econômico possa ocorrer de maneira sustentável, respeitando o meio ambiente e promovendo o bem-estar social. O futuro da mineração depende da capacidade das empresas de integrar esses princípios em suas operações diárias, garantindo que a exploração dos recursos naturais seja realizada com responsabilidade e consciência.

A sociedade, bem mais consciente, saberá, também, se posicionar.

Mariana Santos e Márcia Itaborahy
Mariana Santos e Márcia Itaborahy

MM Advocacia Minerária

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