O Brasil é vastíssimo e compõe-se de seis biomas bastante bem definidos, com suas características de biodiversidade, solo e hidrologia, definidoras dos climas de cada localidade: Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pantanal, Amazônia e Pampas. Inúmeras florestas.
Como nada é compartimentado e o planeta se conforma num sistema, as alterações em uma região influem nas condições de outra, próximas ou não, uma vez que os impactos das atividades humanas têm propagações que se podem assemelhar a ondas: o calor, o frio, as chuvas, as massas de ar, as águas. A natureza se propaga em ondas de consequências, positivas e negativas, sendo os fatos causa e consequência, uns dos outros, sucessivamente.
Tendo chegado, há cinco séculos, o colonizador no litoral brasileiro, e tendo aqui se instalado as maiores aglomerações da população, quando não tinha a humanidade nenhuma noção do que significava “desmatar para construir a civilização”, na forma que a conhecemos, perdeu a Mata Atlântica milhares e milhares de hectares de sua cobertura vegetal e sua rica biodiversidade.
A Mata Atlântica, composta por formações de florestas diversas, mas com condições geoclimáticas similares, possuía, originariamente, área próxima de 1.110.000 Km² de extensão, mas, hoje conta com uma área de apenas 22% de sua cobertura original, sendo que apenas 7% desse ecossistema resiste em fragmentos bem conservados. Entre os fatores causadores da degradação e desmatamento, destaca-se o fato dos principais ciclos econômicos do Brasil terem ocorrido, historicamente, em áreas de cobertura vegetal da Mata Atlântica.
Assim foi que se perderam infinitas riquezas, sem que o brasileiro – e, talvez, o restante do mundo – sequer tivesse sabido de sua existência.
Outros biomas brasileiros, com suas características próprias, cada um com sua relevante importância para a vida humana, para o equilíbrio climático e para a própria economia local e global, sofrem impactos que não têm sido estudados, avaliados e controlados. Os estudo são, de fato, incipientes.
Mas, nenhum bioma tem sido objeto de foco e cobiça de todos os olhos do mundo como a Amazônia: símbolo de exuberância, potência e riqueza, está frágil diante da exploração atual, mas que ainda se faz, sem nenhuma noção do que significa “desmatar para construir a civilização”.
Um erro que se comete mais de uma vez não é um erro!
O bioma Amazônia estende-se por nove países da América do Sul, com a Floresta Amazônica, maior floresta do mundo, em fauna e flora, uma biodiversidade exuberante, capacidade hidroelétrica importante e uma riqueza mineral inestimável. Some-se a isso, o baixo nível socioeconômico da população, de nítida diversidade sociocultural, formada, em grande medida, por povos indígenas e outros povos tradicionais; aglomerados urbanos pontuais, extensas áreas despovoadas e várias e pequenas comunidades dispersas e de difícil acesso, com um modo de vida peculiar.
Essa dimensão de riquezas, ocupada por uma população pobre, com características históricas e sociais próprias, a heterogeneidade do ecossistema, as circunstâncias de cada Estado abrangido pela Floresta, tudo isso demanda análise profunda para tomada de decisões sobre como proceder para se promover, para a região, o desenvolvimento sustentável sobre que se fala e propaga: mais que falar, é preciso exercê-lo, praticá-lo.
A importância desse bioma, tão poderoso e, ao mesmo tempo, vulnerável, constitui-se sob diversas facetas, desde sua essencialidade, quanto à regulação do clima, não só do Brasil, mas de todo o planeta, até suas infinitas possibilidades de fornecimento de insumos para a economia mundial.
As florestas e a mineração
A mineração, que está em toda parte – e já nem é possível não percebê-la – também se instala nas terras amazônicas, ávida, como muitas outras indústrias, regulares e irregulares, por explorar essa enorme riqueza, que, certamente, só parece sem fim!
O mineral é finito. Está impresso no solo ou no subsolo, formado pelo passar dos anos, mas extingue-se, inevitavelmente. Enquanto, porém, existe, gera riqueza, gera possibilidades, gera tudo que significa o nosso progresso civilizatório. Jamais se pode negar sua importância, na história da Humanidade.
O que se nota é que essa corrida para a exploração da vasta Floresta está associada ao aumento de queimadas e assustadores índices de desmatamento, e consequentes e profundas alterações climáticas. E a prioridade dos debates sobre o tema enfrenta enormes dificuldades, inclusive sob o aspecto político: o que significa o desenvolvimento sustentável da Amazônia?
Para o mercado financeiro de todo o mundo, há urgente necessidade de se afastar da polarização que se tem ouvido nos debates sobre o tema, deixando, de um lado, a estratégia exclusivamente ambiental e, de outro, o interesse exclusivamente produtivo e econômico (Folha de São Paulo, 20 de julho de 2020).
Temos defendido, com frequência, a elaboração de uma equação que atenda a realidade da nossa era, sem esquecermos que outras pessoas virão, e terão o direito de vir, com condições de viver como vivemos, ou melhor.
Isso é a sustentabilidade das nossas ações.
Não há por que devastar a Floresta Amazônica, assim como se devastaram a Mata Atlântica e outros biomas, perdendo o que nem sabíamos que tínhamos.
A discussão sobre desmatamento zero ou manutenção do que se tem dito sobre manter a “floresta em pé” é polêmica, mas necessária.
Bem no mínimo, o desmatamento ilegal deve ser imediatamente coibido, sendo uma das metas climáticas do Brasil (Agenda 2030).
A derrubada da cobertura vegetal da Amazônia não parece ter uma alternativa compensatória imediata; o solo, basicamente arenoso, é pouquíssimo fértil para a produção agrícola substitutiva e a mera transição da cobertura vegetal altera as condições climáticas locais e remotas.
A mineração está em franca expansão na região Amazônica e a legislação atual exige que, desde o projeto inicial de exploração mineral, já apresente o empreendimento o plano de fechamento da mina.
As incógnitas da equação estão postas pela sociedade, pela lei e pelo mercado.
“A premência de um novo modelo de desenvolvimento econômico para a região está posta. Temos agora o desafio de conciliar um modelo de desenvolvimento que seja justo, próspero e que use de forma planejada as riquezas naturais disponíveis.” (Sergio Rial, Pres. Santander do Brasil. Folha 2020).
Em maio deste ano, o Banco Mundial, no documento intitulado Equilíbrio Delicado para a Amazônia Legal Brasileira: um Memorando, aponta que a Floresta preservada significa até sete vezes os lucros potencialmente obtidos por meio de diferentes formas de exploração econômica privada na região, que envolvam desmatamento.
Que não sejam palavras apenas. Está toda a sociedade convocada, na verdade, cada um exercendo seu papel.
Está a mineração, mais uma vez, diante da responsabilidade de sua participação histórica: tem interesse nas áreas cobertas pela Floresta Amazônica, tem interesse nos minerais que ali se encontram, tem direitos a gozar e obrigações a cumprir, tem um mercado financeiro que parece despertar para cobrar atuações sustentáveis dos grandes – e, quiçá, dos menores – empreendedores. Tem uma sociedade a que exige contas a serem prestadas, afinal.
Uma responsabilidade sustentável.
Márcia Itaborahy e Mariana Santos