O Ministério Público Federal (MPF) recorreu da decisão da Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) de excluir o ex-presidente da Vale Fábio Schvartsman da ação penal que apura os responsáveis pela tragédia de Brumadinho, em 2019. Na ocasião, o rompimento da barragem do Córrego do Feijão, pertencente à mineradora, matou 272 pessoas.
Com a decisão do TRF6, o então presidente da Vale deixou de responder na Justiça pelas mortes, embora a denúncia aponte que ele sabia do risco de rompimento da barragem e nada fez para impedi-lo. Os embargos de declaração foram apresentados nessa quinta-feira (4).
No recurso, o procurador regional da República Darlan Airton Dias apontou omissão, obscuridade e contradição no acórdão que concedeu habeas corpus ao ex-presidente da Vale, resultando no trancamento das ações penais contra Schvartsman.
De acordo com o MPF, na peça processual, Darlan Dias destaca pontos da decisão que, na avaliação do MPF, devem ser esclarecidos, como a falta de transparência no julgamento com a consequente violação ao direito das vítimas, além do revolvimento de provas de forma indevida pelos julgadores para justificar a decisão de ausência de justa causa da denúncia.
Ainda de acordo com o MPF, nesse sentido, o órgão requer que os embargos tenham efeitos infringentes, ou seja, modificativos para alterar o resultado da decisão, tendo em vista os vícios apontados.
Segundo o procurador, ao examinar as provas pela via do habeas corpus, o colegiado do TRF6 assumiu funções exclusivas do juiz do caso, a quem cabe a formação da convicção quanto à materialidade do fato e à existência de indícios suficientes de autoria ou participação nos crimes contra a vida.
“Na hipótese dos autos, os eminentes julgadores, para afirmarem que carece justa causa na atual fase da persecução penal, valeram-se de aprofundada análise das provas constantes dos autos de origem e atribuíram-lhe interpretação diametralmente diversa à do juízo natural”, aponta o procurador, no recurso.
De acordo com Darlan Dias, o grau de profundidade dos votos na análise da prova, por si só, já demonstra que não há ‘evidente ausência de justa causa. Para o procurador, foi necessário um enorme esforço de revolvimento de provas para se chegar a essa conclusão equivocada. Por isso, ele pede que os vícios na decisão sejam sanados, o que pode alterar a conclusão do julgamento.
MPF critica falta de transparência na decisão
Outro ponto questionado no recurso do MPF foi o formato do julgamento. Darlan Dias diz que não houve transparência na votação, o que prejudicou o devido processo legal e o direito das vítimas.
Ele argumenta que o julgamento do habeas corpus em favor do ex-presidente da Vale foi iniciado em sessão presencial (realizada em dezembro) e depois teve continuidade em meio virtual, contrariando o requerimento feito pelo MPF para que o processo tivesse o julgamento concluído em sessão presencial.
O Ministério Público defendeu em manifestação enviada à Corte que a medida era necessária “em homenagem ao princípio constitucional da publicidade dos julgamentos e também em prestígio ao direito dos familiares das vítimas de acompanharem o julgamento em todos os seus aspectos”.
Ainda conforme o MPF, também é preciso “esclarecer a contradição e a obscuridade do voto do revisor sobre esse ponto”. A procuradoria alega que ele indeferiu o requerimento do MPF com argumento de que, após instalada a sessão virtual, as partes poderiam acessar o voto-vista e aguardar a manifestação dos demais desembargadores, podendo apresentar petições ou esclarecimentos adicionais durante o julgamento. Porém, o procurador aponta que não foi informado às partes a forma como poderiam acessar os votos e apresentar petições ou esclarecimentos.
O MPF ainda aponta que as sessões virtuais do TRF6 não permitem acesso do órgão e das partes aos votos, que só ficam disponíveis com a publicação do acórdão. “Não existe um sistema que permita às partes e ao MPF acompanhar o andamento da sessão virtual”, critica o procurador
Dias ainda cita, ainda, que o Ministério Público só teve acesso aos votos referentes ao HC no dia 25 de março, quando foram publicados no sistema processual do Judiciário (PJe), sendo que antes dessa data a imprensa já havia noticiado o resultado do julgamento.
O procurador conclui que houve “flagrante violação à publicidade dos julgamentos e também aos direitos dos familiares das vítimas de acompanharem o julgamento em todos os seus aspectos”.
Darlan Dias acrescenta, ainda, que o MPF também foi prejudicado em sua função constitucional de custos legis por não poder acompanhar o julgamento e apresentar petições ou solicitações de esclarecimentos ao longo da sessão virtual. “Houve manifesto prejuízo e violação de direitos processuais das partes interessadas, inclusive do MPF na condição de custos legis, ante o impedimento da continuidade do julgamento em sessão presencial”, finaliza.
Clique e relembre os argumetos do TRF-6 para suspensão da ação contra o ex-presidente da Vale.