A Agência Nacional de Mineração (ANM) está cobrando da mineradora Vale um montante de aproximadamente R$ 3,84 bilhões por royalties de mineração supostamente não pagos entre os anos de 2010 e 2017. A cifra é resultado de 24 processos administrativos envolvendo a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), que começaram a tramitar em 2018 e só tiveram auditoria concluída em 2019.
Mais do que apenas uma cobrança isolada, o caso escancara uma questão estrutural: a fragilidade do Estado brasileiro em monitorar e cobrar adequadamente os valores devidos pelas gigantes do setor mineral.
Morosidade e sonegação preocupam municípios mineradores
Para a Associação Brasileira dos Municípios Mineradores (AMIG Brasil), a iniciativa da ANM é positiva, mas cercada de riscos. Um dos principais temores é que o valor seja perdido por prescrição, o que não seria novidade no setor.
A associação ainda alerta para o enfraquecimento da ANM, que hoje conta com apenas quatro servidores para fiscalizar milhares de processos relacionados à CFEM em todo o território nacional.
Isso, segundo o presidente da AMIG, Marco Antônio Lage, compromete diretamente a capacidade de fiscalização e, por consequência, de arrecadação: “É um setor que representa 10% das exportações do país e 4% do PIB, mas é tratado como secundário em termos de controle”.
Relatório do TCU revela perdas bilionárias por falta de controle
O cenário é confirmado por uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), que apontou uma perda de R$ 4 bilhões apenas por prescrição de débitos entre 2017 e 2021. Além disso, o órgão detectou R$ 20 bilhões em créditos lançados, mas ainda sem formalização — o que os deixa vulneráveis ao mesmo destino.
Em 2022, apenas 17 fiscalizações foram feitas em um universo de quase 39 mil processos minerários ativos no país, segundo o TCU. A maioria deles segue em papel, armazenada fisicamente, dificultando a digitalização, o cruzamento de dados e a transparência da gestão pública.
Vale contesta e diz já ter recolhido R$ 30 bilhões em royalties
Em nota, a Vale informou que recorrerá da cobrança, o que suspende sua obrigatoriedade até o julgamento final da ANM. A empresa defende que há pontos da legislação da CFEM em debate judicial e que, nos últimos dez anos, já recolheu cerca de R$ 30 bilhões em royalties, sempre em conformidade com o que entende estar previsto em lei.
Enquanto a disputa se arrasta, o alerta continua para os municípios mineradores, que dependem dos repasses da CFEM para investimentos em infraestrutura, saúde, educação e desenvolvimento local. O risco de que dívidas milionárias virem estatísticas de perdas irreversíveis não pode ser ignorado.