Retomada de Mariana é prejudicada por desafios políticos e eleitorais de 2024

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Há quase uma década, os sobreviventes do desastre causado pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, região Central de Minas Gerais, aguardam por uma indenização que ainda não se concretizou.

Esta tragédia, que resultou na perda de 19 vidas humanas e desencadeou o maior desastre ambiental já registrado no Brasil, deixou marcas profundas na comunidade e no meio ambiente local.

Atualmente, as negociações para a reparação dos danos estão nas mãos do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6). No entanto, conforme investigações conduzidas pelo jornal O TEMPO, um desfecho para este processo parece distante, principalmente por dois motivos distintos.

Primeiro obstáculo contra Mariana: vontade política

O primeiro obstáculo identificado é a ausência de vontade política, uma questão que tem sido motivo de preocupação para membros do TRF-6 e do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).

Na prática, a falta de diálogo entre os governos federal e estadual tem dificultado a definição de responsabilidades e a condução das negociações. A disputa pelo protagonismo entre as partes envolvidas, particularmente diante das divergências ideológicas entre o governador Romeu Zema (Novo) e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tem contribuído para esse impasse.

Em fevereiro, o governador Zema enviou um ofício ao gabinete da Presidência da República cobrando uma solução para a tragédia de Mariana. Nesse documento, ele ressaltou a importância de um diálogo aberto e construtivo entre os entes federativos para resolver questões de interesse coletivo.

Por outro lado, desde seu retorno ao cenário político, Lula tem criticado a postura das empresas responsáveis pelo desastre, afirmando que estas não fizeram o suficiente para reparar os danos causados em Mariana.

A falta de uma agenda clara para discutir este assunto tem gerado frustração entre os envolvidos nas negociações. Alguns interlocutores afirmam que o TRF-6 pode até mesmo encerrar as negociações devido à falta de vontade política. Segundo eles, os termos para a reparação dos danos já estão definidos, faltando apenas a decisão final para colocar um ponto final nesta trágica história.

Segundo obstáculo contra Mariana: eleições

O segundo entrave para as negociações também tem uma dimensão política: as eleições municipais. Enquanto os atingidos aguardam por um desfecho em uma ação em curso no Tribunal de Tecnologia e Construção, em Londres, no Reino Unido, há uma expectativa de que este processo seja concluído em breve.

Nessa ação, os afetados, representados pelo escritório Pogust Goodhead, buscam uma indenização de R$ 230 bilhões, montante substancialmente superior à quantia demandada pelas autoridades brasileiras, estimada em cerca de R$ 116 bilhões.

O contexto das eleições municipais adiciona complexidade ao cenário, influenciando indiretamente as discussões em andamento. O foco dos políticos durante as campanhas eleitorais muitas vezes se desvia dos assuntos mais urgentes, como é o caso da reparação dos danos causados pelo desastre de Mariana.

As disputas políticas locais e a busca por votos podem desviar a atenção dos governantes e dos órgãos públicos das questões cruciais que exigem soluções rápidas e eficazes.

Enquanto isso, a ação em Londres representa uma esperança para os afetados, que buscam uma compensação justa pelos prejuízos sofridos. A indenização pleiteada é significativamente maior do que a sugerida pelas autoridades brasileiras, refletindo a magnitude dos danos causados pela tragédia.

A iminência de um desfecho nesse processo judicial internacional adiciona pressão às negociações em curso no Brasil. A expectativa é de que uma resolução favorável aos afetados possa impulsionar o avanço das discussões e acelerar o processo de reparação dos danos em Mariana. No entanto, as incertezas políticas locais podem continuar a ser um obstáculo adicional, complicando ainda mais o caminho rumo à justiça e à recuperação para as comunidades atingidas.

Terceiro obstáculo contra Mariana: acordo entre governos e empresas

Fontes vinculadas ao governo federal identificam um terceiro entrave que está contribuindo para a estagnação das negociações em torno do acordo de Mariana: a discrepância entre a proposta apresentada pelas empresas e as expectativas das autoridades.

Enquanto os governos federal e estadual buscam uma compensação na ordem de R$ 116 bilhões, as empresas envolvidas na tragédia demonstram disposição para pagar aproximadamente R$ 42 bilhões.

Essa disparidade coloca em evidência a necessidade de encontrar um ponto de equilíbrio que satisfaça todas as partes envolvidas, o que poderia resultar em uma redução desse montante. No entanto, a oferta de R$ 42 bilhões está consideravelmente aquém do considerado razoável pelos órgãos públicos participantes.

Desde o início das negociações, havia a expectativa de que a repactuação de Mariana resultasse em valores significativamente superiores aos pagos pela tragédia de Brumadinho, que ceifou 272 vidas em janeiro de 2019, além de causar extenso dano ambiental na bacia do rio Doce, em consequência das atividades da Samarco.

Contudo, a proposta de R$ 42 bilhões, imediatamente rejeitada pelas autoridades envolvidas, representaria apenas uma diferença de 13% em relação ao montante destinado a Brumadinho, onde os afetados e as autoridades receberam um total de R$ 37,6 bilhões.

Essa disparidade entre as expectativas e a proposta apresentada pelas empresas torna evidente a necessidade de uma revisão séria e substancial da oferta. As autoridades envolvidas na negociação, juntamente com os representantes dos afetados, insistem na importância de uma compensação justa e adequada que reflita adequadamente os danos sofridos pela comunidade de Mariana e pelo meio ambiente afetado.

Encontrar um consenso nesse aspecto é crucial para avançar em direção a uma solução que proporcione algum alívio e justiça para aqueles que ainda sofrem as consequências desse desastre devastador.

Empresas firmaram um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC)

Em 2016, as empresas envolvidas no desastre de Mariana firmaram um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), estabelecendo a criação da Fundação Renova, vinculada às mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton.

Este acordo delineou a implementação de 42 programas e projetos destinados a reparar os danos causados pela tragédia.

Desde então, aproximadamente R$ 35 bilhões foram desembolsados pelas empresas, porém, o dinheiro investido não foi capaz de efetivamente reparar os estragos provocados pela catástrofe.

A constatação de que os danos persistem, mesmo após significativos investimentos, levou até mesmo as próprias mineradoras a reconhecerem a insuficiência do modelo atual.

Em 2021, o Ministério Público de Minas Gerais chegou a solicitar a extinção da Fundação Renova. Entretanto, o ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), interveio suspendendo a tramitação do processo meses após seu início.

Tal decisão foi tomada em resposta aos pedidos da Advocacia Geral da União (AGU) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama).

O impasse em torno da continuidade da Fundação Renova reflete a complexidade e a sensibilidade do processo de reparação dos danos causados pelo desastre de Mariana.

Apesar dos investimentos substanciais realizados até o momento, ainda há um longo caminho a percorrer para garantir uma recuperação efetiva das áreas afetadas e o amparo adequado às comunidades atingidas.

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