Entre os itens mais relevantes sobre a reforma tributária no Brasil está a necessidade de revisão da Lei Kandir, mecanismo criado em 1996 que isenta o minério exportado pelo Brasil de tributação. O impacto negativo desse modelo é uma reclamação recorrente da Associação dos Municípios Mineradores de Minas e do Brasil (Amig) e foi debatido em audiência pública no Congresso Nacional no último mês de maio.
A legislação tem, segundo representantes de entidades do setor, impedido a participação dos municípios brasileiros na cadeia produtiva da mineração. O presidente da entidade, José Fernando Aparecido de Oliveira, explica que praticamente todo o minério extraído no Brasil vai para outros países para alimentar uma cadeia produtiva. Ou seja, fora do Brasil o minério gera emprego, renda e industrialização, enquanto o mesmo não acontece no país de origem.
Para o presidente da Amig, o setor tem atuado dentro de uma ótica tributária perversa. “Precisamos urgentemente corrigir a distorção presente na Lei Kandir, que há mais de 20 anos desonera o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para bens não renováveis exportados. 83% do minério de ferro produzido no Brasil é exportado e não gera impostos no mercado interno. A legislação favorece a expansão da indústria no exterior em detrimento do Brasil. É preciso ter uma visão agregadora de valor internamente, de gerar emprego e renda em território nacional”, explica.
O presidente do Instituto de Justiça Fiscal, Dão Real Pereira dos Santos, diz que a proposta de reforma tributária não está atacando esse problema. “O objetivo não é acabar com a Lei Kandir, e sim acabar com a perpetuação da não tributação. Se o governo quiser, ele pode fazer isso. Porém, isso cria uma resistência enorme no mercado. Aí surgem as desculpas, como por exemplo: se cobrar vai encarecer o produto no exterior e não vamos conseguir vender, com isso o país vai perder exportação. Essa é uma justificativa sem base de sustentação”, garante.
Dão Real explica que o preço da commodity não é negociado venda a venda, mas sim cotado internacionalmente. “Se eu for cobrar imposto eu não vou deixar de vender por isso, o que vai acontecer é que se terá um lucro menor na venda. Em geral, as mineradoras possuem lucros bilionários. O lucro líquido da Vale, por exemplo, chegou à casa dos R$120 bilhões. Essa margem alta é devido à tecnologia que ajuda na redução de custos da atividade.”
Para Real, quem está ganhando com a revolução tecnológica, que muitas vezes é financiada por estados e Governo Federal, são as mineradoras. “Ou seja, através dos pesquisadores e das universidades, os governos estaduais financiam os estudos que ajudam a reduzir os custos da atividade mineral e fazem com que o lucro das mineradoras avance. Porém, os cofres públicos não ganham nada em relação a esse lucro”, detalha.
Desequilíbrio
Os números da mineração no Brasil impressionam. Em 2022, as exportações minerais brasileiras alcançaram US$ 41,7 bilhões, de acordo com dados divulgados pela Amig. O saldo comercial mineral (exportações menos importações) de quase US$24,9 bilhões equivaleu a 40% do saldo comercial brasileiro, de US$ 61,8 bilhões.
O consultor de Relações Institucionais e Econômicas da Amig, Waldir Salvador, diz que é preciso transformar os tributos sobre a mineração em investimentos socioeconômicos nos municípios. “Está comprovado em números que a mineração brasileira, principalmente aquela que exporta, pode e deve contribuir mais para o país. Queremos que as mineradoras sejam cada vez mais prósperas, mas que a exportação tenha equidade e equilíbrio entre aquilo que fica no país e aquilo que fica nos cofres de seus sócios”, diz Salvador.
“É preciso transformar essa arrecadação em diversificação econômica e na mitigação dos impactos provocados pela atividade mineral nas cidades. Somente a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) não é suficiente. Isso não pode continuar assim e a AMIG não medirá esforços para mudar esse cenário”, destaca.
Palestra
Os presidente do Instituto de Justiça Fiscal ministrará uma palestra sobre o tema na próxima segunda-feira (19), na Academia Mineira de Letras, em Belo Horizonte. O evento integra a programação do lançamento pela Amig da edição especial do livro “A concessão Itabira Iron – A origem da Vale e os primórdios da indústria da mineração no Brasil”. Clique e saiba mais.