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Braskem: tríplice responsabilidade pelo dano socioambiental

Imagem: UOL

 

Já dissemos, por aqui, que todas as atividades humanas causam algum impacto no mundo exterior. Sendo negativo ou degradante esse impacto, tem-se a figura do dano. E aquele que provoque um dano chama a si a responsabilidade. No caso dos danos ambientais, há no Brasil a tríplice responsabilização: cível, penal e administrativa.

Se, de um lado, o objetivo da responsabilidade civil é a reparação do dano causado, nas responsabilidades administrativa e penal, o objetivo é a punição daquele que pratica atos que infringem a legislação, independentemente do dano efetivo.

Assim, no caso da responsabilização civil, no Brasil não se cogita em culpa ou dolo: a responsabilidade é objetiva e a obrigação é a reparação integral dos prejuízos causados.

Já nas responsabilidades administrativa e penal, há que haver culpa ou dolo (intenção) para que se configure a responsabilização daquele que pratica o ato ilegal.

De imediato, já se percebem situações totalmente diversas. A reparação é o que se pretende, se houve o dano. A punição, ao contrário, somente se dirige a quem, com negligência, imperícia ou imprudência, praticou ato danoso; ou, ainda, àquele que, intencionalmente ou assumindo os riscos, praticou atos ilícitos, que a lei presume prejudiciais ao meio ambiente ou a terceiros.

Nessa linha de raciocínio, historicamente, a responsabilidade penal estava centrada nas pessoas físicas e, por longo período do Direito, não se falava em punição por crime de pessoa jurídica. Noutro viés, mantinha-se a penalidade administrativa.

Contudo, ao longo das últimas décadas, houve um movimento global para preencher essa lacuna da legislação, reconhecendo que empresas, enquanto entidades legais, podem ser responsabilizadas por atos criminosos, especialmente quando relacionados a danos ao meio ambiente.

No contexto brasileiro, a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) estabeleceram bases para a responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica. O artigo 225 da Constituição consagra a proteção do meio ambiente, enquanto a Lei de Crimes Ambientais prevê sanções penais, administrativas e cíveis aplicáveis às pessoas jurídicas que cometem infrações ambientais.

A Constituição determina, expressamente, que a responsabilidade pelos danos ambientais é objetiva, solidária e integral.

Surge, assim, uma dicotomia, quando o tema é a responsabilização ambiental criminal e administrativa: sendo o agente pessoa física, a apuração da responsabilidade é subjetiva, observando-se se a ação foi praticada com dolo ou culpa. Se o agente é pessoa jurídica, a responsabilidade é objetiva, e não se cogita de dolo ou culpa. E acrescente-se que a responsabilidade da pessoa jurídica não implica, diretamente, na responsabilidade de seus diretores e prepostos. Para esses últimos, avalia-se dolo ou culpa.

A responsabilidade das mineradoras

As responsabilidades penal e administrativa das mineradoras pelos danos socioambientais que resultem de sua atividade está embasada nos princípios constitucionais que garantem a proteção ao meio ambiente. No contexto brasileiro, a Constituição Federal de 1988, eminentemente principiológica, estabelece importantes diretrizes para essa responsabilização.

O princípio do Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado é norteador das interpretações legislativas, e consagra o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado para as atuais e para as futuras gerações. É um direito transgeracional, e imputa responsabilidade profunda na atual geração, uma vez que esta deve resguardar, preservar, garantir tal direito para si mesma e para o futuro. É uma obrigação da coletividade, pessoas físicas e jurídicas, tanto quanto do poder público, a defesa e preservação de um meio ambiente saudável, ecologicamente equilibrado.

Nessa linha, fica evidente que, mesmo sendo pessoas abstratas, as pessoas corporativas têm vontade, tem interesses, atuam efetivamente no mundo e causam impactos com sua atuação. Se tal atuação se resolve em prejuízos, obriga-se à reparação civil. Se a atuação é ilícita, com infração legal, responde administrativa e penalmente.

No caso específico da Braskem, em Maceió, será necessário avaliar se houve crime ambiental. Se sim, a responsabilidade da empresa é objetiva; seus sócios e diretores, porém, deverão ter suas condutas avaliadas sob este aspecto.

Para o nosso ordenamento jurídico, a previsão é expressa  e estabelece a responsabilidade penal por condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, indicando que as práticas degradadoras sujeitam os infratores a sanções penais, além das administrativas e civis (art. 225, p.3º, da CF): As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal firma orientação para todos:

O dano patrimonial causado pela exploração minerária irregular, com inegável impacto ambiental, não constitui simples ilícito civil, equiparável, por exemplo, a um acidente de trânsito ou ao ressarcimento decorrente de uma bolsa de estudos irregularmente concedida. [RE 1.408.464 AgR, rel. min. Rosa Weber, red. do ac. min. André Mendonça, j. 3-7-2023, P, DJE de 25-8-2023.]

A Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98) trata das sanções penais relacionadas ao meio ambiente, e, entre os artigos 54 e 61, prevê uma série de crimes ambientais, como poluição, destruição de florestas e outras formas de degradação ambiental, incluindo as respectivas penalidades, como detenção e multas. Para as pessoas jurídicas, a penalidade se enquadra em multas, suspensão de atividades até fechamento do empreendimento.

Apesar das divergências entre os juristas, a aplicação de penalidades às entidades corporativas que pratiquem crimes ambientais visa a tratar-se como elemento dissuasório e repressivo, objetivando, ao final, a preservação ambiental.

Não se pode deixar de mencionar que há vozes importantes que defendem que a penalidade administrativa seria mais eficaz, além de suficiente, até porque as penalidades aplicadas às pessoas jurídicas têm natureza administrativa e não penal, propriamente dita.

A par dos debates, a violação culposa ou dolosa da legislação ambiental é de enorme gravidade, posto que atinge a milhares de pessoas, a um só tempo, sendo, muitas vezes, irrecuperável o dano ou iminente ou grave o risco. Assim, a aplicação principiológica dos preceitos constitucionais se sobrepõe.

A responsabilização administrativa e penal das empresas mineradoras pelos danos que causem enfrenta desafios, diante de sua pujança, importância econômica e poder. São, em grande medida, empresas estrangeiras ou parte de grupos estrangeiros dificultando a comprovação da culpa, sempre que necessária sua apuração, visto que esta envolve várias escalas de direção interna.

Por outro lado, a imposição das penalidades, principalmente considerando-se as multas, deve atender à proporcionalidade do porte e da capacidade financeira das empresas, o que, também, gera grandes e complexos debates.

Por fim, os órgãos fiscalizadores sofrem grandes dificuldades, com mão de obra insuficiente e mal remunerada.

As soluções passam pela mudança de cultura organizacional, com adoção de boas práticas, implementação de políticas governamentais que reconheçam e recompensem práticas empresariais sustentáveis e ambientalmente responsáveis, educação ambiental de qualidade, fortalecimentos dos órgãos de fiscalização, com investimento em recursos e capacitação para os órgãos ambientais responsáveis pela fiscalização, garantindo que haja uma atuação eficaz na aplicação das leis, fortalecendo sua capacidade de monitorar e aplicar sanções eficazes, além de adoção de planos que valorizem a promoção da transparência nas ações administrativas e envolvimento da sociedade civil no processo decisório, garantindo uma fiscalização mais abrangente e uma aplicação justa das sanções.

Marcia e Marian corte
Márcia Itaborahy e Mariana Santos

MM Advocacia Minerária

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