Como anunciado, a partir dos problemas vividos em Maceió, causados pela gigante Braskem, trazemos discussões sobre as responsabilidades que devem impor-se àquele que cause danos à sociedade.
Já se disse, por inúmeras vezes, que a mineração é atividade essencial para todos e que, em nenhuma hipótese, será razoável se opor ao seu desenvolvimento.
Por outro lado, é, sem dúvidas, atividade altamente impactante, gerando danos ao meio ambiente e à sociedade, principalmente a do entorno de suas instalações.
Toda atividade humana, por mais banal que possa parecer, causa impacto ao ambiente e à sociedade, mais ou menos perceptível, dependendo da intensidade, da amplitude do ato e dos resultados.
Tem-se, porém, que se determinado impacto causa ao ambiente ou à sociedade consequências negativas, prejudiciais, há dano.
A lei 6.938/81 (que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente) conceitua degradação ambiental como alteração adversa das características do meio ambiente (art. 3º).
É possível se entender, facilmente, então, que o dano se caracteriza por alterações negativas, resultados negativos, sobre o meio ambiente, sobre a comunidade afetada, sobre o indivíduo.
A atividade minerária tem, em si, a potencialidade danosa do meio ambiente e das comunidades vizinhas, devendo tais resultados estarem inseridos no seu licenciamento e no plano de aproveitamento econômico, já com avaliações e propostas de solução ou compensação.
Ainda assim, há que se considerarem os danos socioambientais provocados pelas empresas mineradoras, e sua reparação encontra respaldo na Constituição Federal de 1988, que estabelece princípios e direitos fundamentais relacionados à proteção do meio ambiente.
Tem-se por certo que a Constituição Federal é, principalmente quanto ao tema ambiental, eminentemente principiológica. Em sendo assim, os princípios se aplicam aos fatos, na interpretação legislativa, ainda que a referida lei não mencione expressamente o caso concreto.
São vetores mestres da aplicação da lei aos casos de danos socioambientais os princípios do Desenvolvimento Sustentável, da prevenção e precaução, da reparação integral e da responsabilidade objetiva.
O artigo 225, da CF/88, consagra o meio ambiente como bem de uso comum do povo, essencial à qualidade de vida, e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. O desenvolvimento sustentável é, portanto, princípio norteador, conciliando atividades econômicas com a preservação ambiental.
Tanto a prevenção quanto a precaução são instrumentos para a proteção ambiental, incumbindo ao Poder Público e à coletividade garantir o meio ambiente ecologicamente equilibrado; se houver o dano, porém, a reparação deve ser integral, coroando a máxima do poluidor-pagador.
Por fim, a responsabilização do empreendimento é objetiva, ou seja: não vem ao caso se houve ou não a intenção de poluir, de causar o dano: tendo havido o dano, causado pelo agente (empresa), este deve ser reparado. Esta diretriz é anterior à própria Constituição Federal, estando expressa na referida lei de implementação da Política Nacional do Meio Ambiente.
De acordo com estudos realizados pela Fundação David Suzuki, mais de 140 países alteraram sua Constituição Federal para exigirem proteção ambiental, além de 98 países que reconheceram, expressamente, o direito constitucional de viver em um ambiente saudável.
Em outros países, além do Brasil, como Alemanha e Canadá, há também a responsabilização objetiva pelo dano ambiental, apesar de, em diversos casos, se encontrarem negligenciadas as medidas de efetivação das diretrizes previstas nas legislações.
No Brasil, há a tríplice responsabilidade pelo dano causado: civil, penal e administrativa, que será explicado com mais detalhes nos próximos artigos. Aguarde!
O que acontecerá com a Braskem?
Fica evidenciado no caso concreto da Braskem sobre a população maceioense que, constatado que os danos decorreram da atividade da mineradora, ela será responsabilizada.
Para a responsabilização civil, o objetivo é a reparação do dano, a compensação, com fundamento do parágrafo segundo do art. 225 da CF: Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
Os Tribunais brasileiros orientam-se pelo dispositivo, sendo que o STF pacificou a questão, em controle concentrado de constitucionalidade:
As atividades de exploração de recursos minerais, dado o seu especial impacto no meio ambiente, estão sujeitas a regime jurídico complexo e robusto de controle das suas operações e das condicionantes impostas como salvaguardas ambientais, incidentes tanto o direito minerário como o direito ambiental e seus correspondentes instrumentos e competência. […] [ADI 4.031, rel. min. Rosa Weber, j. 2-10-2023, P, DJE de 9-11-2023.]
Ao se tratar a responsabilidade civil ambiental, a visão holística do dano é fundamental, avaliando-se desde o indivíduo até a coletividade. A Constituição determina e a sociedade poderá exigir a reparação integral, com foco na efetividade e na sustentabilidade.
O mundo tem evoluído para adoção de critérios abrangentes de apreciação dos interesses dos entes econômicos e a preservação do equilíbrio ecológico, social e da própria economia, na busca da convergência dos interesses envolvidos (ESG – environment/ambiente, social e governança).
O Brasil e o mundo já viveram desastres ambientais gravíssimos: Mariana, por exemplo, em 2015, envolvendo a Samarco (joint venture entre a Vale e a BHP), foi o maior desastre ambiental da história mundial, nos últimos 100 anos. Considerando-se o volume de rejeitos, em metros cúbicos, equivale à soma de outros dois acontecimentos do tipo já registrados (Filipinas, 1982 e 1992). Os dados são de estudo promovido pela Bowker Associates (consultoria de gestão de risco relativos à construção pesado nos EUA), em parceria com o geofísico David Chambers.
E não se esquece Brumadinho, marco na mente dos brasileiros.
Estamos, hoje, diante dos fatos vivenciados em Maceió. E são vários outros que demandam da população a ciência suficiente para a exigência de medidas que assegurem a preservação, ou, diante do dano, a compensação.
Medidas de prevenção e precaução são essenciais. Mais importante e eficaz que a reparação é a não poluição, o não dano. A precaução e a prevenção são importantes ferramentas para a efetivação do que se conceitua como desenvolvimento verdadeiramente sustentável.