Justiça impede mineração na Serra da Gandarela por patrimônio arqueológico

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O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) obteve decisão favorável na Justiça em ação que pedia reconhecimento do valor cultural de uma “paleotoca” existente nos limites do Distrito Espeleológico Serra do Gandarela. A decisão proíbe a mineradora Vale, o Estado e o Município de Caeté, na região Central de Minas, de promover qualquer medida que gere a destruição ou a deterioração da área.

De acordo com o MP, há estudos que comprovam que possivelmente as paleotocas foram feitas por preguiças gigantes de dois dedos e é possível que haja  fósseis no local. “São estruturas de bioerosão em ambiente continental, encontradas na forma de túneis de centenas de metros de comprimento e que foram escavadas em rochas, por mamíferos fossoriais gigantes que habitavam a América do Sul, durante o período Terciário e Quaternário, para fins de moradia permanente ou temporária”, dizem os autos.

“A preservação destas cavidades é de suma importância, pois, para além das evidências do comportamento desses animais, há elevada chance de que sejam encontrados outros fósseis no local”, defende o MPMG na Ação Civil Pública.

Em agosto de 2010, durante estudos espeleológicos realizados no licenciamento do Projeto Apolo, houve a classificação de 69 cavidades com a indicação de uma possível paleotoca, segundo o MPMG.  Após estudos prévios para o licenciamento do projeto, constatou-se que a área abriga significativo conjunto de cavernas, inclusive associadas a vestígios paleontológicos existentes no local, o que permite considerá-la como um complexo paleontológico de enorme potencial para estudos e pesquisas.

O órgão apurou que uma cavidade em especial, a AP-38, está na área da mineradora Vale e situada na porção da Serra do Gandarela, em Caeté. A paleotoca é considerada como registro único da presença da megafauna extinta no Quadrilátero Ferrífero, escavada por milodontídeos cavadores (preguiças-gigantes de dois dedos).

A Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico aponta que a Paleotoca existente na cavidade AP-38 é a única conhecida em Minas Gerais. “Além da sua origem rara, a cavidade AP-38 se destaca, também, pelo seu tamanho, com projeção horizontal dimensionada em 345 metros”.

“Trata-se da maior Paleotoca conhecida até o momento, com 340 metros de comprimento, com valores que legitimam plenamente sua proposição como sítio paleontológico do Geoparque Quadrilátero Ferrífero”, aponta o MPMG.

Degradação

Técnicos do Mistério Público realizaram vistoria no local em 2017 e atestaram que se trata de cavidade bastante exposta, fora dos limites do Parque Nacional da Serra do Gandarela, o que dificultaria a proteção do bem. O órgão,então, recomendou à Vale que apresentasse estudo atualizado referente à área de influência do Projeto Apolo.

Também em 2017, foi expedida Recomendação ao Iepha para que formalizasse o processo de tombamento estadual da paleotoca, e ao Município de Caeté, com o objetivo de se formalizar o processo de tombamento municipal. Porém, de acordo com o MP, os entes informaram não dispor de estrutura para a elaboração do dossiê de tombamento.

Um estudo elaborado pelo Instituto Prístino em 2020 apontou a existência de marcas e elementos visíveis que sugeririam a alteração das condições originais. Uma vistoria detectou desplacamentos, pisoteamento, carreamento de materiais, introdução de elementos na cavidade e pichações. O relatório destacou que eventual aprovação do licenciamento da Mina Apolo à Vale representa risco à integridade do bem cultural, em razão da dinâmica do empreendimento e do dano induzido por modificações antrópicas em cavidades.

Já o setor técnico do MPMG concluiu que as maiores ameaças à paleotoca da Serra do Gandarela estão associadas à implantação de empreendimentos minerários na região. Além disso, a integridade da paisagem envolvente, externa à caverna, é fundamental para sua correta e adequada avaliação. “Portanto, alterações drásticas no ambiente certamente prejudicarão a produção de conhecimento científico relativo à esta cavidade de gênese única no Quadrilátero Ferrífero”, recomenda o órgão.

Na ação civil pública, o MPMG enfatiza que o estado de conservação do local já começou a ser deteriorado, em parte pela ação humana, em parte pela omissão do Poder Público na devida proteção.

Por meio de nota, a Vale informou que não foi notificada pela Justiça sobre o caso, mas que segue a legislação e que as atividades exercidas na região são regulares, com respaldo dos órgãos competentes. Já a prefeitura de Caeté e o Governo de Minas ainda não se manifestaram sobre o assunto. A Justiça estabeleceu multa diária em caso de descumprimento das determinações.

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